"O espectador que não for siderado pela metalinguagem pode simplesmente usufruir o retrato desse mordomo culto e fantasioso. Santiago Badariotti Merlo era um nobre sem estirpe, uma fascinante contradição de classe, um ser trágico." Deixando de lado a latente METALINGUAGEM da qual me falta conhecimento técnico para dizer qualquer coisa que não passe de opiniões ou pitacos, consigo falar com propriedade apenas da MINHA SENSIBILIDADE diante do retrato desse mordomo no texto acima. Uma figura caricata, que me encantou particularmente por sua simplicidade e amor aos vários tipos de arte. "Perpetua" em páginas e páginas a história da aristocracia de muitas épocas, encontrando nesse exercício algum sentido para a vida. Dentre muitos detalhes em tantas entrelinhas me apego a DANÇA DAS MÃOS, um espetáculo a parte.
Deixo aqui algumas matérias que mais me identifiquei sobre o filme.
"Em “Santiago”, Salles assume, pela primeira vez em sua filmografia, que todo documentário sobre o outro é um documentário sobre si, assim como se costuma dizer que toda crítica é uma autobiografia...
Santiago é o mediador entre o passado e o presente; entre João Moreira Salles e as memórias da “casa da Gávea”; entre uma promessa modernista de país e o esvaziamento dessa promessa; entre uma elite pautada por valores aristocráticos e o eclipse desses valores, tais como o decoro, o respeito e o apreço por uma gestualidade ritualística. Enfim, Santiago é o mediador entre “eles” e “nós”." (leia em TRÓPICO)
"Mas, acima de tudo, é quando surgem as imagens de um filme caseiro da família Moreira Salles que parece se revelar a motivação para Santiago. São imagens que guardam relação somente indireta, aproximada, com o personagem-título. Essa é a artimanha que o personagem narrador-autor parece esconder ou ignorar: as imagens não são apresentadas somente por ter relação indireta com o personagem-título - ao contrário, parece mais que este personagem-título continuou sendo usado apenas por estar indiretamente relacionado àquelas imagens. O que elas dizem e o que elas escondem é o filme que o narrador-autor de Santiago talvez precisasse fazer e certamente ainda não fez." (leia em CONTRACAMPO)
JOÃO MOREIRA SALES fala para a BRAVO em entrevista:
"Fiz Santiago pensando sobretudo em sanar as aflições que me rondavam a alma e que, de certo modo, ainda me atormentam. Trata-se de um filme essencialmente terapêutico. Quando decidi rever o material que rodei em 1992, tinha 43 anos e atravessava uma intensa crise. Estava adquirindo a consciência muito profunda de que as coisas realmente passam e de que não conseguimos recuperá-las. Para mim, que não acredito em nada, que não alimento nenhuma fé metafísica, a morte e a passagem do tempo são problemas imensos, obsessões que sempre me acompanharam. A diferença é que, com 30 anos, possuía apenas uma compreensão abstrata, intelectual do assunto. Agora, a compreensão se tornou concreta. Compreendo com as tripas. Intuitivamente, julguei que retomar o documentário inacabado me ajudaria a organizar o caos em que imergira. Há quem, no meio de uma tempestade existencial, resolva usar drogas, viajar a Lourdes e clamar por um milagre, conhecer o Dalai Lama ou praticar esporte. Eu resolvi fazer um filme".
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